INTRODUÇÃO
Os "novíssimos" são as últimas realidades que todo ser humano enfrentará, segundo a doutrina católica. Eles consistem na morte, no juízo particular logo após a morte, no purgatório como possível estado intermediário de purificação, no inferno como estado de condenação eterna, e no paraíso como estado de eterna bem-aventurança na presença de Deus.
Refletir sobre os novíssimos é de suma importância para todo cristão, pois nos ajuda a viver com sabedoria e retidão, na perspectiva das realidades eternas. Como nos ensina o Catecismo Romano, "considerar a morte frequentemente e com seriedade é uma prática que leva a uma vida virtuosa e à esperança na ressurreição" (Catecismo Romano, Cap. IV, §13). Essa meditação nos convida a uma sincera conversão, a viver em estado de graça e a progredir continuamente no amor a Deus e ao próximo. Nos motiva a usar bem o tempo presente, que é o único que temos para "ganhar" o céu e evitar o inferno.
Numa cultura que tende a evitar o tema da morte e a viver como se esta vida fosse a única que existe, a meditação sobre os novíssimos é um poderoso antídoto contra a superficialidade, o hedonismo e o materialismo. Ela nos desperta para o que realmente importa, nos incentiva a não absolutizar as realidades terrenas, mas a vivê-las na perspectiva do nosso destino eterno.
O objetivo deste artigo é aprofundar a reflexão sobre cada um dos novíssimos — morte, juízo, inferno, paraíso e purgatório — à luz da fé católica. Buscaremos compreender melhor o que a Igreja ensina sobre essas realidades, com a ajuda de grandes mestres espirituais como Santa Catarina de Gênova e São João da Cruz, bem como do Catecismo da Igreja Católica. Veremos como a consideração dos novíssimos, longe de nos levar ao medo ou ao desespero, é um convite à esperança, à vigilância e à santidade de vida. Pois, como diz São Paulo: "A noite vai adiantada, e vem chegando o dia. Deixemos, pois, as obras das trevas e revistamo-nos das armas da luz" (Rm 13,12).
1. A MORTE
"E em todas as tuas obras, lembra-te do teu fim e jamais pecarás" (Eclo 7,40).
A morte entrou no mundo como consequência do pecado original. Pelo pecado de Adão, a humanidade perdeu o dom da imortalidade e ficou sujeita à lei inexorável da morte. "Por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte" (Rm 5,12). Desde então, a sentença divina "és pó e ao pó voltarás" (Gn 3,19) pesa sobre cada ser humano.
Uma das características mais angustiantes da morte é sua imprevisibilidade. Não sabemos nem o dia nem a hora em que ela virá nos buscar. Pode chegar de repente, quando menos esperamos, surpreendendo-nos desprevenidos. Por isso, o Senhor nos adverte: "Vigiai, porque não sabeis em que dia virá o vosso Senhor" (Mt 24,42). É preciso estar sempre preparado, vivendo cada dia como se fosse o último, na graça de Deus.
Meditar frequentemente sobre a morte é um meio poderosíssimo para a conversão e o progresso espiritual. Os santos recomendavam vivamente este exercício. Pensar na morte nos ajuda a relativizar as coisas passageiras desta vida e a buscar o que é eterno. Faz-nos compreender a vaidade das honras, riquezas e prazeres mundanos, que a morte inexoravelmente nos arrancará. Estimula-nos a aproveitar bem o tempo presente, único que temos para amar e servir a Deus, fazer o bem e ganhar o Céu.
Sobretudo, a meditação da morte nos leva a encará-la na perspectiva da fé. Para o cristão, a morte não é um muro intransponível, mas uma porta que se abre para a eternidade. É a passagem deste mundo para a Casa do Pai. É o dies natalis, o dia do nascimento para a verdadeira Vida. Bem-aventurados os que morrem no Senhor, porque suas boas obras os acompanham (cf. Ap 14,13) e vão receber a coroa da glória que não murcha (cf. 1Pd 5,4). Ao contrário, ai daqueles que morrem em pecado mortal, pois sofrerão a "segunda morte" (Ap 20,14), a condenação eterna.
Peçamos, pois, a graça de uma santa morte, perseverando fiéis a Deus até o último suspiro. Preparemo-nos para esse momento decisivo, do qual depende nosso destino eterno, vivendo cada dia com fervor, como se fosse o último. Quando chegar a hora, poderemos dizer confiantes como São Paulo: "Combati o bom combate, terminei a carreira, guardei a fé. Desde já me está reservada a coroa da justiça, que me dará o Senhor, justo juiz, naquele Dia" (2Tm 4,7-8).
2. O JUÍZO
Logo após a morte, a alma se apresenta diante de Jesus Cristo para o juízo particular. Este é o momento decisivo em que se define o destino eterno da pessoa.
"Está determinado que os homens morram uma só vez, e depois disto o juízo" (Hb 9,27).
Nesse encontro face a face com o Senhor, a alma verá instantaneamente, à luz de Deus, toda a sua vida. Jesus, que tudo sabe e conhece o mais íntimo dos corações (cf. Jo 2,25), manifestará com perfeita clareza o valor moral de todos os atos, palavras, pensamentos e omissões da pessoa. Nada ficará oculto, pois diante d'Ele "todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele a quem havemos de prestar contas" (Hb 4,13).
O critério fundamental desse juízo será o amor: "Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? Então lhes direi claramente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade" (Mt 7,22-23). Não bastam as belas palavras, nem mesmo os milagres. O que vale é ter vivido na caridade, amando a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo (cf. Mt 22,36-40). Serão examinadas as obras de misericórdia praticadas ou omitidas em relação aos mais pequeninos, com os quais o próprio Cristo se identificou (cf. Mt 25,31-46).
Além desse juízo particular logo após a morte, haverá também, no fim dos tempos, o Juízo Universal. Então, diante de todo o universo reunido, serão manifestas a justiça e a misericórdia de Deus no governo do mundo. Aparecerá com clareza o sentido último da história, tantas vezes obscuro aos nossos olhos. E Cristo virá "na sua majestade e todos os anjos com ele... E todas as nações serão reunidas diante dele" (Mt 25,31-32). Será o triunfo definitivo do bem sobre o mal, a vitória do Cordeiro imolado, o ingresso dos eleitos nas núpcias eternas e a condenação irrevogável dos réprobos. Então se cumprirá perfeitamente a palavra do Senhor: "Eis que venho sem demora, e trago comigo a recompensa, para retribuir a cada um segundo as suas obras" (Ap 22,12).
3. O INFERNO
O inferno é a condenação eterna, o estado de separação definitiva de Deus, destinado àqueles que morrem em pecado mortal, em rejeição consciente e obstinada a Deus. É a pior desgraça que pode acontecer à pessoa humana, pois consiste na privação perpétua da visão beatífica, para a qual fomos criados.
O inferno não é uma imposição arbitrária de Deus, mas o resultado da livre escolha da criatura em rejeitar o seu Criador e último fim. Deus, que nos fez sem nós, não nos salva sem nós. Ele respeita a liberdade que nos deu e ratifica eternamente a opção fundamental que cada um fez em vida: viver com Ele ou sem Ele. Quem rejeita obstinadamente o amor de Deus, excluindo-se da comunhão com Ele pelo pecado grave não arrependido, "auto-condena-se" ao inferno.
As Sagradas Escrituras, com linguagem figurada mas inequívoca, descrevem os sofrimentos atrozes do inferno: o "fogo que não se apaga" (Mc 9,43), o "verme que não morre" (Mc 9,48), o "pranto e ranger de dentes" (Mt 8,12), as "trevas exteriores" (Mt 22,13), a "segunda morte" (Ap 20,14), a "gehena" (Mt 5,22), o "lago de fogo e enxofre" (Ap 21,8). Mais que sofrimentos físicos, estas imagens apontam para a indescritível dor espiritual da alma condenada, consumida pelo remorso, desespero e ódio, por ter perdido o seu Bem infinito.
A possibilidade real do inferno, atestada claramente por Jesus Cristo, deve ser um forte estímulo à conversão e à vigilância. "Temei antes Aquele que pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo" (Mt 10,28), adverte o Senhor. Diante desta tremenda perspectiva, como não fazer todo o possível e o impossível para evitar o pecado e perseverar no amor de Deus? Como não implorar cada dia a sua graça e misericórdia? Como não aproveitar o tempo presente para assegurar a salvação eterna? Pois "que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua alma?" (Mt 16,26).
4. O PARAÍSO
O paraíso ou céu é a bem-aventurança eterna, o estado de perfeita e definitiva união com Deus, destinado àqueles que morrem na graça e amizade divinas. É a realização plena e transbordante de todos os anseios mais profundos do coração humano, a satisfação total de todo desejo de felicidade.
No céu, os bem-aventurados gozam da visão beatífica, ou seja, contemplam a Deus "face a face" (1Cor 13,12), conhecendo-O e amando-O de modo perfeito, imediato e intuitivo. Já não "como em espelho e de maneira confusa", mas na luminosa evidência de sua glória. Mergulhados no oceano da divindade, participam plenamente da vida íntima da Santíssima Trindade. Unidos totalmente a Cristo, vivem Dele, com Ele e Nele.
Lá, enfim, encontram aquela paz e alegria imensas pelas quais tanto suspiraram na terra. O céu é o fim último e a realização de todas as aspirações mais nobres do homem, o estado de suprema e definitiva bem-aventurança, a plenitude da vida e do amor. Nada mais a desejar, nada mais a buscar: os santos possuem o Bem infinito e eterno, fonte de todo bem. Vivem em perfeita comunhão com Maria Santíssima, os anjos e todos os bem-aventurados, na alegria sem fim do banquete nupcial do Cordeiro.
A firme esperança dessa felicidade futura deve animar e impulsionar toda a vida cristã. Em meio às provações e sofrimentos deste mundo, o pensamento do céu nos conforta e fortalece. Nos estimula a perseverar no bem, sabendo que "as aflições momentâneas e leves da vida presente produzem para nós um peso eterno de glória" (2Cor 4,17). Nos ajuda a viver com desprendimento dos bens passageiros e a buscar "as coisas do alto" (Cl 3,1). Nos enche de ânimo para lutar o bom combate da fé, na certeza de que "os sofrimentos do tempo presente não têm proporção com a glória que deverá revelar-se em nós" (Rm 8,18). Pois "o que o olho não viu, o ouvido não ouviu, nem jamais penetrou o coração do homem, é o que Deus preparou para aqueles que o amam" (1Cor 2,9).
5. O PURGATÓRIO
O purgatório é um estado de purificação após a morte, destinado àqueles que morreram na graça e amizade de Deus, mas ainda não estão totalmente purificados para entrar na bem-aventurança do céu. É uma doutrina firmemente ensinada pela Igreja Católica, baseada na Sagrada Escritura e na Tradição.
O purgatório é uma expressão admirável da misericórdia e da justiça divinas. Da misericórdia, porque Deus, em seu amor, não quer que nada de manchado entre no céu; da justiça, porque toda falta deve ser expiada e toda dívida paga até o último centavo (cf. Mt 5,26). As almas do purgatório já estão salvas, confirmadas na graça, mas precisam ainda purificar-se das faltas veniais não perdoadas e satisfazer plenamente a justiça divina pelas penas temporais devidas aos pecados já perdoados.
Os sofrimentos do purgatório têm um sentido medicinal e satisfatório. Medicinal, porque, como um fogo purificador, vão eliminando das almas todo apego desordenado, toda "ferrugem" do pecado, tornando-as cada vez mais capazes da união com Deus. Satisfatório, porque, como uma reparação oferecida à santidade e justiça divinas, vão saldando a dívida de pena que os pecados merecem. Esses sofrimentos, por mais intensos que sejam, são temperados pela certeza da salvação e pelo ardente amor a Deus.
A doutrina do purgatório está intimamente ligada à consoladora verdade da comunhão dos santos. As almas do purgatório, sendo membros da Igreja padecente, podem ser ajudadas pelos sufrágios (orações, esmolas, sacrifícios e indulgências) dos fiéis que ainda peregrinam na terra (Igreja militante) e pela intercessão dos santos do céu (Igreja triunfante). É uma grande obra de misericórdia rezar pelos defuntos, mandando celebrar missas por sua intenção. Eles não podem mais merecer por si mesmos, mas podem ser socorridos por nós. E quando entrarem no céu, serão nossos intercessores. Admirável é a solicitude da Igreja por seus filhos falecidos, a quem nunca abandona, até que estejam perfeitamente purificados e dignos de entrar no gozo eterno da casa do Pai.
CONCLUSÃO
Ao longo deste artigo, meditamos sobre as realidades últimas que nos esperam após a morte, conhecidas na doutrina católica como os "novíssimos": a morte, o juízo, o inferno, o paraíso e o purgatório.
Vimos que a morte é o fim inevitável de nossa peregrinação terrena, o momento decisivo que sela nosso destino eterno. No juízo particular, cada alma se apresenta diante de Cristo para prestar contas de sua vida, sendo examinada à luz do amor. O inferno é a terrível possibilidade da condenação eterna, fruto não da vontade de Deus, mas da obstinada rejeição da criatura ao Criador. O paraíso, ao contrário, é a meta sublime de nosso ser, a perfeita bem-aventurança na visão e no amor de Deus, para a qual fomos criados. O purgatório, enfim, é o estado de purificação necessária para aqueles que, morrendo na graça de Deus, ainda não estão plenamente preparados para a glória celeste.
A meditação sobre estes novíssimos, longe de ser mórbida ou deprimente, é sumamente salutar e até imprescindível para uma vida cristã autêntica. Ela nos desperta do torpor da indiferença, nos cura da ilusão da autossuficiência, nos impele a aproveitar o tempo presente para amar e servir a Deus. Conscientes da brevidade e precariedade da vida terrena, somos estimulados a buscar "as coisas do alto" (Cl 3,1), a usar os bens deste mundo como meios e não como fins, a praticar as obras de misericórdia, a progredir no caminho da santidade.
Que a consideração dos novíssimos, portanto, nos leve a uma sincera conversão, a retificar o rumo de nossa vida, reordenando todas as coisas para Deus. E que ela reacenda em nós a esperança da vida eterna, a "bem-aventurada esperança" (Tt 2,13) que nos faz antecipar, desde já, as alegrias sem fim do Céu. Pois "o que o olho não viu, o ouvido não ouviu, nem jamais penetrou o coração do homem, é o que Deus preparou para aqueles que o amam" (1Cor 2,9).
ORAÇÃO DE ENCERRAMENTO
Senhor Jesus Cristo, Senhor da Vida e da História, em vossas mãos coloco minha existência e meu destino eterno. Concedei-me a graça de viver sempre com os olhos fixos na eternidade, lembrando que esta vida é passageira e que o mais importante é alcançar a salvação e a santidade.
Tende misericórdia de mim, perdoai meus pecados e fortalecei-me na luta contra o mal. Dai-me a graça da perseverança final, para que, no momento decisivo da morte, eu esteja unido a vós na fé, na esperança e no amor.
Por intercessão de Santo Afonso de Ligório, concedei-me a graça de viver cada dia como se fosse o último, na vossa presença, para que, no momento da minha morte, eu possa ser acolhido no vosso reino eterno. Que eu possa, um dia, ver-vos face a face no Paraíso e cantar eternamente vossas misericórdias, junto com Maria Santíssima e todos os anjos e santos. Amém.
Referências e Fontes
Citações:
Gn 3,19: "És pó e em pó te hás de tornar."
Lc 18,1: "Convém orar sempre e não desfalecer."
1Cor 13,12: "Agora vemos em espelho e de maneira confusa, mas depois veremos face a face."
2Cor 4,17: "As aflições momentâneas e leves da vida presente produzem para nós um peso eterno de
glória."
2Cor 5,10: "Todos nós devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba a recompensa do bem ou do mal que tiver feito enquanto estava no corpo."
Ef 4,24: "Revestir-se do homem novo."
Mt 25,31-46: Parábola do Juízo Final, separação entre "ovelhas" e "cabritos".
Ap 14,13: "Bem-aventurados os que morrem no Senhor."
Ap 20,14: O inferno é a "segunda morte."
Ap 21,8: "Mas os covardes, os incrédulos, os depravados, os assassinos, os impudicos, os feiticeiros, os idólatras e todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre, que é a segunda morte."
2Mac 12,46: "Por esta razão [Judas Macabeus] fez este sacrifício expiatório em favor dos mortos, para que fossem libertados do pecado."
Referências Adicionais:
Santa Catarina de Gênova, "Tratado sobre o Purgatório".
São João da Cruz, "Noite Escura", "Subida do Monte Carmelo".
Santo Afonso de Ligório, "Preparação para a Morte".
São Boaventura, "Brevilóquio".
São Cirilo de Jerusalém, "Catequeses Mistagógicas".
São João Crisóstomo, "Homilias".
Santo Agostinho, "Confissões".
Catecismo da Igreja Católica, nn. 1020-1060, 1371, 1471-1479.
Concílio de Florença (1439).
Concílio de Trento (1563).
Papa Bento XII, Constituição "Benedictus Deus" (1336).
Papa Paulo VI, Constituição Apostólica "Indulgentiarum Doctrina" (1967).
Código de Direito Canônico (1983).
Bento XVI, Spe Salvi, Carta Encíclica sobre a Esperança Cristã, 2007.
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