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Exploramos o “Adoro Te Devote”, mergulhando nos mistérios da Eucaristia com Santo Tomás de Aquino


ARTIGO ADOROTE DEVOTECaminho de Fé

INTRODUÇÃO

"Adoro Te Devote" é um hino eucarístico de louvor e adoração, composto por Santo Tomás de Aquino no século XIII. Representa uma das cinco orações eucarísticas que o santo escreveu em honra a Jesus Cristo, presente na Eucaristia. O título, traduzido do latim, significa "Eu vos adoro devotamente", e a oração é um profundo testemunho de fé, reverência e entrega ao mistério de Cristo oculto sob as espécies do pão e do vinho.

Embora originalmente concebida como uma expressão pessoal de adoração eucarística por São Tomás, essa oração foi posteriormente incorporada à liturgia, especialmente na festa de Corpus Christi e durante momentos de exposição e bênção do Santíssimo Sacramento.

Apesar de existirem variações no texto em latim, o significado essencial da oração permanece inalterado. A riqueza de suas traduções — com pelo menos 16 versões poéticas significativas para o inglês e várias para o português — evidencia a universalidade e a atemporalidade do "Adoro Te Devote" como expressão da adoração eucarística.

Este hino tem suas raízes no século XIII, originando-se no contexto da instituição da Solenidade de Corpus Christi por parte do Papa Urbano IV em 1264, após o milagre eucarístico de Bolsena. Este evento, no qual uma hóstia consagrada começou a sangrar nas mãos de um padre que duvidava da transubstanciação, inspirou o Papa a solicitar a Santo Tomás de Aquino e São Boaventura a composição de hinos para a nova festividade.

Respondendo ao pedido papal, Santo Tomás de Aquino criou não apenas o "Adoro Te Devote", mas também outros quatro hinos eucarísticos para marcar a celebração de Corpus Christi:

1. Pange, Lingua ("Vamos todos louvar juntos"): hino para as Vésperas.

2. Sacris Solemniis ("A Santa Festa alegre celebremos"): hino para o Ofício das Leituras.

3. Verbum Supernum Prodiens ("Eis que o Verbo, habitando"): hino para as Laudes.

4. Lauda Sion Salvatorem ("Louva, Sião, o Salvador"): sequência da Missa de Corpus Christi.

Juntos, esses hinos compõem o ofício litúrgico "Sacerdos in Aeternum" ("Sacerdote Eternamente"), promulgado pelo Papa Urbano IV. Neles, Santo Tomás condensa, de maneira poética e teológica, a profundidade da fé católica e a adoração a Jesus na Eucaristia, perpetuando-se como um tesouro da tradição litúrgica católica.

Imagem de uma mesa de altar com um cálice de ouro e uma hóstia consagrada iluminados por um feixe de luz descendente, em uma igreja gótica com vitrais coloridos. Ao lado, uma pena e um pergaminho evocam Santo Tomás de Aquino. Atmosfera de reverência e mistério, estilo 16:9.

 

CORPUS CHRISTI

A Celebração de Corpus Christi: Origem e Importância

Corpus Christi, ou "Corpo de Cristo", é uma solenidade litúrgica que exalta a presença real de Jesus Cristo na Eucaristia, um dos sacramentos centrais da Igreja Católica. Instituída no século XIII, esta festa ressoa com significados profundos e multifacetados, refletindo sobre o mistério da fé e a unidade da Igreja. Destacam-se alguns aspectos cruciais da importância desta celebração:

- Presença Real de Cristo: Corpus Christi celebra a maravilhosa presença real de Cristo na Eucaristia, considerada o ápice da Missa, onde os fiéis experimentam a mais profunda comunhão com Deus. Essa celebração enfatiza que, através da Eucaristia, Jesus continua a se fazer presente entre seu povo, alimentando-os espiritualmente.

- Reflexão sobre a Eucaristia: A festa serve como um convite à meditação sobre o papel vital da Eucaristia na vida dos cristãos. Recorda a Última Ceia, quando Jesus instituiu este sacramento, ensinando que o pão é Seu corpo e o vinho, Seu sangue, destinados a perpetuar Sua presença salvífica até o fim dos tempos.

- Doutrina da Transubstanciação: Corpus Christi reforça a crença na transubstanciação, doutrina que proclama a transformação do pão e vinho no Corpo e Sangue de Cristo, após a consagração pelo sacerdote. A hóstia consagrada é, portanto, venerada como a presença real de Jesus.

- Adoração Pública: Esta festa promove uma expressão pública e solene de fé e adoração ao Santíssimo Sacramento, através de missas festivas, procissões pelas ruas e momentos intensos de adoração, manifestando publicamente a fé e a devoção dos fiéis ao mistério eucarístico.

- Centralidade na Vida da Igreja: Corpus Christi sublinha que a Igreja se fundamenta e vive da Eucaristia, memória viva do mistério pascal de Cristo, que é a pedra angular da fé cristã. A Eucaristia está no coração da existência da Igreja, sendo fonte de sua vitalidade espiritual.

- Unidade da Comunidade Cristã: Ao reunir os fiéis para celebrar o Corpo de Cristo, esta festa fortalece a comunhão e a unidade da Igreja. As procissões e celebrações coletivas simbolizam a jornada conjunta do povo de Deus rumo à eternidade, nutridos pelo alimento espiritual da Eucaristia.

Corpus Christi, portanto, não é apenas uma festa de profunda adoração eucarística, mas também uma celebração que reafirma a fé, promove a unidade dos cristãos e nos lembra da generosidade infinita de Cristo, que se oferece como alimento para a jornada da vida. Ela ressalta a beleza e a profundidade da fé católica na presença real de Jesus na Eucaristia, um sacramento que está no centro da vida cristã.

 

MERGULHO NO MISTÉRIO: ANÁLISE DE 'ADORO TE DEVOTE

Antes de nos aprofundarmos na oração "Adoro Te Devote", é importante contextualizar e preparar o terreno para uma imersão mais profunda no significado deste hino eucarístico que transcende séculos. Compilado pelo ilustre Santo Tomás de Aquino no século XIII, "Adoro Te Devote" não é apenas uma expressão de fé, mas um tesouro da tradição litúrgica católica, rico em teologia e poesia.

Esta oração é um convite à reflexão e à adoração, destacando a presença real de Jesus Cristo na Eucaristia, um mistério central da fé católica. Em cada linha, Santo Tomás de Aquino tece um profundo reconhecimento da grandeza e do amor divinos manifestados na simplicidade do pão e do vinho consagrados.

À medida que nos aproximamos da leitura e da contemplação desta oração, faremos uma jornada espiritual que nos levará ao coração do mistério eucarístico. Para garantir que abordemos essa jornada com a devida reverência e precisão, optamos por realizar nossa análise partindo diretamente do texto original em latim de "Adoro Te Devote". Essa abordagem nos permite mergulhar nos significados mais profundos das palavras de Santo Tomás sem as camadas adicionais de interpretação que podem acompanhar as traduções. Ao fazer isso, buscamos capturar a essência do que foi expresso pelo autor, permitindo uma compreensão mais rica e uma conexão mais íntima com a oração.

A seguir, apresentaremos o texto da oração "Adoro Te Devote" em sua forma original, seguido de uma análise estrofe por estrofe. Em nossa análise, nos dedicaremos a explorar os temas teológicos, as imagens poéticas e os convites espirituais contidos em cada verso, proporcionando assim uma visão aprofundada do amor e da devoção que Santo Tomás de Aquino tinha pelo Santíssimo Sacramento.

Ao embarcarmos nesta jornada de fé e reflexão, que possamos nos abrir para experimentar a beleza e a profundidade do amor de Deus manifestado na Eucaristia, renovando nosso próprio compromisso de adoração e devoção ao mistério do amor divino presente entre nós.

 

ADORO TE DEVOTE

 

1. Adoro te devote, latens Deitas,

Quae sub his figuris vere latitas:

Tibi se cor meum totum subiicit,

Quia te contemplans totum deficit.

 

2. Visus, tactus, gustus in te fallitur,

Sed auditu solo tuto creditur.

Credo quidquid dixit Dei Filius:

Nil hoc verbo Veritatis verius.

 

3. In cruce latebat sola Deitas,

At hic latet simul et humanitas;

Ambo tamen credens atque confitens,

Peto quod petivit latro paenitens.

 

4. Plagas, sicut Thomas, non intueor;

Deum tamen meum te confiteor.

Fac me tibi semper magis credere,

In te spem habere, te diligere.

 

5. O memoriale mortis Domini!

Panis vivus, vitam praestans homini!

Praesta meae menti de te vivere

Et te illi semper dulce sapere.

 

6. Pie pellicane, Iesu Domine,

Me immundum munda tuo sanguine.

Cuius una stilla salvum facere

Totum mundum quit ab omni scelere.

 

7. Iesu, quem velatum nunc aspicio,

Oro fiat illud quod tam sitio;

Ut te revelata cernens facie

Visu sim beatus tuae gloriae.



ANÁLISE DETALHADA DE CADA ESTROFE

 

ESTROFE 1

Na primeira estrofe do hino eucarístico "Adoro Te Devote", podemos vislumbrar a riqueza teológica e a profundidade da devoção que São Tomás de Aquino transmite através de seus versos. Aqui está uma análise detalhada de cada linha:

1. Adoro te devote, latens Deitas: O hino começa com uma expressão de adoração fervorosa, "Adoro te devote", onde o orante se dirige à divindade escondida, "latens Deitas". Esta linha ressalta a fé na presença real e substancial de Deus no Santíssimo Sacramento, apesar de sua aparência externa ser apenas pão e vinho.

2. Quae sub his figuris vere latitas: Aqui, São Tomás enfatiza a verdade ("vere") da presença de Cristo sob as espécies sacramentais ("sub his figuris"). A palavra "figuris" aponta para o conceito de que o pão e o vinho são signos sensíveis que indicam e contêm a realidade divina oculta sob eles.

3. Tibi se cor meum totum subiicit: Este verso revela a resposta do coração humano à presença divina. "Tibi se cor meum totum subiicit" significa que o orante submete todo o seu coração a Deus, demonstrando uma entrega total de amor e vontade.

4. Quia te contemplans totum deficit: A estrofe termina com uma humilde admissão das limitações humanas, "Quia te contemplans totum deficit". Contemplar a Deus é reconhecer uma realidade tão transcendente e misteriosa que ultrapassa a capacidade de compreensão e articulação humana, levando a uma sensação de perda ou esvaziamento de si diante da grandeza divina.

Em resumo, essa estrofe nos leva para o coração da adoração católica, onde o mistério da fé se encontra com o amor e a humildade. Ao contemplar a Eucaristia, São Tomás nos mostra como o cristão deve se aproximar deste sacramento: com reverência, amor, entrega total e reconhecimento da própria pequenez diante do divino.

 

ESTROFE 2

Na segunda estrofe do "Adoro Te Devote", São Tomás de Aquino medita sobre a natureza da fé em contraste com a percepção sensorial:

1. Visus, tactus, gustus in te fallitur: Esta linha trata das limitações dos sentidos humanos — visão, tato e paladar — no que se refere à identificação da presença de Cristo na Eucaristia. A palavra "fallitur" indica que estes sentidos são enganados ou falham, pois não podem discernir a presença real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho.

2. Sed auditu solo tuto creditur: Aqui, São Tomás destaca que a segurança da fé vem pelo ouvir ("auditum") — ou seja, pela palavra de Deus revelada. O "solo" ressalta que, dentre todos os sentidos, o ouvir é o que nos conduz à verdade da fé, sem enganos.

3. Credo quidquid dixit Dei Filius: Esta linha é uma profissão de fé ("Credo") no que foi dito por Jesus Cristo, o Filho de Deus ("Dei Filius"). Ao afirmar "quidquid dixit", o autor manifesta uma aceitação incondicional da palavra de Cristo como verdade absoluta e infalível.

4. Nil hoc verbo Veritatis verius: A estrofe conclui com a afirmação de que nada é mais verdadeiro do que esta Palavra da Verdade ("Nil hoc verbo Veritatis verius"). São Tomás coloca a palavra de Cristo acima de qualquer realidade sensível, pois é na palavra de Cristo que encontramos a verdade mais segura e indubitável.

Portanto, nesta estrofe, São Tomás reitera a preeminência da fé baseada na Revelação divina sobre o conhecimento empírico. A verdade da presença de Cristo na Eucaristia é captada não pelos sentidos, mas pela fé que se apoia na palavra de Cristo, palavra esta que é a própria Verdade. Esta é uma poderosa expressão da crença católica na transubstanciação, onde, pela consagração durante a missa, acredita-se que o pão e o vinho se transformam verdadeiramente no Corpo e Sangue de Cristo, mesmo que os sentidos humanos não percebam essa mudança.

 

ESTROFE 3

A terceira estrofe do hino "Adoro Te Devote" penetra mais profundamente no mistério da Encarnação e na economia salvífica de Deus:

1. In cruce latebat sola Deitas: São Tomás começa esta estrofe contemplando o paradoxo da cruz. A afirmação "sola Deitas" aponta para o fato de que, na cruz, a divindade de Cristo estava oculta ("latebat") aos olhos humanos. A cruz, um instrumento de tortura e vergonha, escondia em si a presença de Deus, não revelando a glória que pertence à sua natureza divina.

2. At hic latet simul et humanitas: Aqui, o foco muda para a Eucaristia, onde, segundo a fé católica, não só a divindade de Cristo está oculta ("latet"), mas também a sua humanidade ("simul et humanitas"). Isso reflete a união hipostática, a doutrina de que Jesus Cristo possui duas naturezas, humana e divina, que estão inseparavelmente unidas em uma só pessoa.

3. Ambo tamen credens atque confitens: Esta linha reflete a resposta de fé do crente, que, embora não veja, crê ("credens") e confessa ("confitens") tanto a divindade quanto a humanidade de Cristo presente no Sacramento. "Ambo" ressalta a crença nas duas naturezas de Cristo.

4. Peto quod petivit latro paenitens: São Tomás conclui a estrofe com uma referência à história do bom ladrão crucificado ao lado de Cristo (cf. Lucas 23:42-43). O "latro paenitens" pediu a Jesus para se lembrar dele quando viesse em seu reino. Da mesma forma, o orante pede para compartilhar da promessa de salvação que Cristo ofereceu ao ladrão.

Em síntese, nesta estrofe, São Tomás de Aquino realça o grande mistério da fé cristã presente na cruz e na Eucaristia, acreditando e confessando a presença de Jesus Cristo em sua plenitude divina e humana. O pedido final é um ato de humilde confiança, um desejo de se juntar ao ladrão arrependido na esperança da redenção eterna.

 

ESTROFE 4

A quarta estrofe do "Adoro Te Devote" reflete uma progressão na jornada de fé do crente e faz referência a São Tomás, o Apóstolo:

1. Plagas, sicut Thomas, non intueor: Aqui, São Tomás de Aquino contrasta sua experiência com a de São Tomás Apóstolo, conhecido por sua incredulidade até que viu e tocou as feridas de Cristo após a ressurreição (João 20:24-29). "Plagas... non intueor" significa que, diferentemente do apóstolo, ele não vê fisicamente as feridas de Cristo na Eucaristia.

2. Deum tamen meum te confiteor: Apesar de não ter a prova tangível das chagas de Cristo como São Tomás Apóstolo teve, o autor declara firmemente sua fé, confessando que reconhece ("confiteor") a presença de Deus ("Deum meum") na Eucaristia.

3. Fac me tibi semper magis credere: Esta linha é uma oração pedindo um aumento na fé ("credere"). Ele implora a Deus que o ajude a crer ainda mais firmemente ("semper magis") na Sua presença real na Eucaristia.

4. In te spem habere, te diligere: O orante também pede por uma esperança mais forte ("spem habere") e um amor mais profundo ("diligere") por Deus. A esperança e o amor são, junto com a fé, as três virtudes teologais que fundamentam a vida cristã e a relação do crente com Deus.

Em resumo, a estrofe faz um apelo por uma fé mais profunda, uma esperança inabalável e um amor ardente por Deus. Ao usar a experiência de São Tomás Apóstolo, São Tomás de Aquino nos ensina que a fé verdadeira não depende da visão física, mas se baseia na confiança na palavra de Deus e na graça divina que nos permite acreditar, esperar e amar além do que podemos ver ou tocar.

 

ESTROFE 5

Na quinta estrofe do "Adoro Te Devote", São Tomás de Aquino medita sobre o significado eucarístico como memorial da Paixão de Cristo e como sustento da vida espiritual:

1. O memoriale mortis Domini!: O termo "memoriale" remete ao conceito bíblico de memorial, um ato de lembrança que, na tradição judaico-cristã, tem um sentido ativo e participativo. Não é apenas uma recordação mental, mas uma celebração que torna presente a realidade salvífica da morte do Senhor ("mortis Domini"). Aqui, a Eucaristia é exaltada como o memorial que atualiza e torna presente o sacrifício de Cristo.

2. Panis vivus, vitam praestans homini!: "Panis vivus" significa "pão vivo", que destaca a crença na Eucaristia como fonte de vida verdadeira e eterna, diferentemente do pão comum que sustenta a vida física. "Vitam praestans homini" afirma que este "pão vivo" concede ("praestans") vida ao ser humano, aludindo a João 6:51, onde Cristo se identifica como o "pão vivo que desceu do céu".

3. Praesta meae menti de te vivere: O orante pede que sua mente ("meae menti") possa viver ("vivere") da realidade de Deus na Eucaristia, ou seja, que sua compreensão e meditação se alimentem continuamente da presença eucarística de Cristo.

4. Et te illi semper dulce sapere: Esta última linha é uma súplica para que o sabor ou o doce conhecimento ("dulce sapere") de Cristo na Eucaristia seja uma experiência constante e satisfatória ("semper"). "Sapere" tem um duplo significado, referindo-se tanto ao sabor físico quanto ao discernimento espiritual, expressando o desejo de que a presença de Cristo seja sempre percebida como doce e gratificante.

Portanto, nesta estrofe, a celebração eucarística é apresentada como um lembrete poderoso da morte redentora de Jesus e uma fonte vital de sustento espiritual. São Tomás revela seu profundo desejo de que essa verdade eucarística permeie a mente e seja sempre uma experiência doce e vivificante, transformando toda a percepção e compreensão da realidade.

 

ESTROFE 6

A sexta estrofe do "Adoro Te Devote" contém uma fervorosa oração de purificação e salvação através do sacrifício de Jesus:

1. Pie pellicane, Iesu Domine: São Tomás invoca Jesus com a metáfora do "Pie pellicane". Na tradição medieval, acreditava-se que o pelicano era capaz de ferir o próprio peito para alimentar seus filhotes com seu sangue, o que se tornou um símbolo de Cristo, que se sacrificou na cruz pelo bem da humanidade. O termo "Pie" significa piedoso, reforçando a imagem de Cristo como a personificação da misericórdia e do sacrifício amoroso.

2. Me immundum munda tuo sanguine: Aqui, o orante pede a Jesus que o purifique ("munda") de sua impureza ("immundum") com o Seu sangue ("tuo sanguine"). Reconhecendo a própria pecaminosidade, o crente apela para o poder redentor do sangue de Cristo, que na doutrina católica é presente na Eucaristia.

3. Cuius una stilla salvum facere: O verso reflete a crença na eficácia salvífica do sacrifício de Cristo, onde mesmo uma única gota ("una stilla") do Seu sangue possui o poder de salvar ("salvum facere"). Há aqui um reconhecimento da infinita graça contida no menor dos elementos consagrados.

4. Totum mundum quit ab omni scelere: A estrofe conclui com a afirmação de que o sangue de Cristo tem o poder de libertar ("quit") o mundo inteiro ("totum mundum") de todo pecado ("ab omni scelere"). A expressão sugere a magnitude da redenção oferecida por Cristo, que é suficiente para expiar os pecados de toda a humanidade.

Em resumo, a estrofe é uma profunda expressão de confiança na misericórdia divina, manifestada no sacrifício de Jesus na cruz e sacramentalmente presente na Eucaristia. O orante reconhece sua necessidade de purificação e a suficiência da graça de Cristo para a salvação de todos os pecadores.

 

ESTROFE 7

A sétima e última estrofe do "Adoro Te Devote" expressa o anseio do crente pela visão beatífica de Deus:

1. Iesu, quem velatum nunc aspicio: A estrofe começa com uma contemplação direta de Jesus, reconhecendo a sua presença velada na Eucaristia. O termo "velatum" enfatiza que, embora a presença de Cristo esteja oculta sob as espécies eucarísticas, o crente o observa ("aspicio") com olhos de fé.

2. Oro fiat illud quod tam sitio: O orante faz uma oração ("Oro") expressando um desejo profundo e ardente ("sitio"), pedindo que aquilo que ele tanto deseja ("illud quod tam sitio") se realize. O uso da palavra "sitio", que significa "ter sede", sublinha um desejo espiritual intenso, ecoando as palavras de Cristo na cruz ("Sitio", João 19:28), mas aqui referindo-se ao anseio pela visão plena de Deus.

3. Ut te revelata cernens facie: Este verso é uma súplica para ver a face de Cristo não mais velada, mas revelada ("revelata"). "Cernens" implica não apenas uma visão superficial, mas um encontro face a face, íntimo e direto, com a divindade.

4. Visu sim beatus tuae gloriae: A estrofe termina com o desejo do crente de ser "beatus" (abençoado ou feliz) através da visão ("visu") da glória de Cristo ("tuae gloriae"). Este anseio é pelo cumprimento final da promessa cristã, a beatitude eterna, na qual a alma encontra sua satisfação última na visão direta de Deus, que é o fim último de toda a vida cristã.

Esta estrofe captura o desejo mais profundo do coração humano de conhecer e experimentar Deus diretamente. São Tomás articula um dos mais fundamentais anseios cristãos: o de passar da fé para a visão, da esperança para a realização, e do amor sacramental para o amor ininterrupto na presença da glória divina. É uma oração que antecipa a esperança da vida eterna, onde a fé se tornará visão, e a presença eucarística será substituída pela presença inefável de Deus.

CONCLUSÃO

Ao concluirmos nossa jornada através da análise do "Adoro Te Devote", emergimos com uma apreciação renovada e aprofundada não só pela genialidade de Santo Tomás de Aquino, mas também pelo mistério inefável da Eucaristia no coração da fé católica. Este hino, tecido com a habilidade de um mestre teólogo e a sensibilidade de um devoto fervoroso, nos guia a uma contemplação mais íntima do amor divino manifestado no sacramento do altar.

A celebração de Corpus Christi, com sua ênfase na adoração pública e na comunhão comunitária, ressoa com os temas explorados no "Adoro Te Devote". Ao recordarmos a instituição deste sacramento por Cristo durante a Última Ceia, somos convidados a viver a Eucaristia não apenas como um memorial da paixão e ressurreição de Jesus, mas como um encontro vivo com Ele, aqui e agora.

Nossa análise, embasada no texto original em latim, buscou honrar a intenção de Santo Tomás de capturar a essência transcendental da fé eucarística. Ao trazermos essas reflexões para o contexto contemporâneo, esperamos que os leitores se sintam inspirados a renovar sua própria devoção e adoração ao Santíssimo Sacramento, reconhecendo na Eucaristia o alimento para nossa jornada espiritual e o vínculo de nossa unidade como Corpo de Cristo.

Como forma de encerramento e como uma oração que ecoa os séculos de fé católica, apresentamos o "Adoro Te Devote" em português. Esta tradução, enriquecida pela análise que a precede, é oferecida como um convite para viver as verdades profundas expressas por Santo Tomás de Aquino em sua oração original. Que a leitura ou a escuta desta versão traduzida sirva não apenas como um fim, mas como um início para uma adoração mais profunda e pessoal a Jesus na Eucaristia.

Ao adorarmos "devotamente" e reconhecermos a "Divindade escondida" no pão e no vinho, façamos ecoar em nossos corações o desejo ardente de Santo Tomás: ver a face de Cristo não mais velada, mas em sua plena glória. Que este anseio nos guie em nossa caminhada espiritual, alimentados pelo Pão da Vida, até que possamos contemplá-lo face a face na eternidade.

Com estas reflexões e orações, concluímos nossa exploração do "Adoro Te Devote". Que a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam conosco hoje e sempre. Amém.

 

EU VOS ADORO DEVOTAMENTE


Eu vos adoro devotamente, ó Divindade escondida,

Que verdadeiramente oculta-se sob estas aparências,

A Vós, meu coração submete-se todo por inteiro,

Porque, vos contemplando, tudo desfalece.

 

A vista, o tato, o gosto falham com relação a Vós

Mas, somente em vos ouvir em tudo creio.

Creio em tudo aquilo que disse o Filho de Deus,

Nada mais verdadeiro que esta Palavra de Verdade.

 

Na cruz, estava oculta somente a vossa Divindade,

Mas aqui, oculta-se também a vossa Humanidade.

Eu, contudo, crendo e professando ambas,

Peço aquilo que pediu o ladrão arrependido.

 

Não vejo, como Tomé, as vossas chagas

Entretanto, vos confesso meu Senhor e meu Deus

Faça que eu sempre creia mais em Vós,

Em vós esperar e vos amar.

 

Ó memorial da morte do Senhor,

Pão vivo que dá vida aos homens,

Faça que minha alma viva de Vós,

E que à ela seja sempre doce este saber.

 

Senhor Jesus, bondoso pelicano,

Lava-me, eu que sou imundo, em teu sangue

Pois que uma única gota faz salvar

Todo o mundo e apagar todo pecado.

 

Ó Jesus, que velado agora vejo

Peço que se realize aquilo que tanto desejo

Que eu veja claramente vossa face revelada

Que eu seja feliz contemplando a vossa glória. Amém


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