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Elevação e Intercessão: A Profundidade Teológica e Espiritual da Ascensão do Senhor na Doutrina Católica


ARTIGO ASCENSAO DO SENHORCaminho de Fé

 

INTRODUÇÃO

A celebração da Ascensão do Senhor é um dos momentos mais significativos no calendário litúrgico da Igreja Católica. Este evento não apenas marca uma transição crucial na vida de Jesus Cristo, mas também possui profundas implicações teológicas e espirituais que ressoam até os dias atuais. A Ascensão é observada 40 dias após a Páscoa, simbolizando o fim da presença física de Jesus entre seus discípulos e o início de sua gloriosa existência à direita de Deus Pai. Este artigo se propõe a explorar a riqueza desse mistério, mergulhando nas dimensões teológicas e espirituais que sustentam esse pilar da fé cristã.

O objetivo deste artigo é duplo. Primeiramente, busca-se elucidar o significado teológico da Ascensão, discutindo como esse evento se interliga com os conceitos centrais da doutrina católica, como a realeza e o sacerdócio de Cristo. Em segundo lugar, visa-se contemplar a influência espiritual da Ascensão na vida da Igreja e dos fiéis, explorando como a partida física de Cristo amplia nossa compreensão da presença contínua e dinâmica do Espírito Santo entre nós.

A Ascensão do Senhor é celebrada exatamente 40 dias após a Páscoa, uma cifra que na tradição bíblica simboliza um período completo de preparação ou purificação. Este evento não é meramente uma despedida, mas um portal que se abre para uma nova forma de presença de Jesus no mundo. Com a Ascensão, Jesus não se afasta de sua missão terrena; ao contrário, ele a eleva a uma nova dimensão, assumindo seu lugar como intercessor eterno e mediador diante de Deus Pai, enquanto prepara o caminho para o envio do Espírito Santo. Esta celebração litúrgica nos convida a refletir sobre o fim da limitação física de Jesus, que agora, ressurreto e elevado, transcende tempo e espaço para estar com cada um de nós, em todos os lugares e em todos os tempos.


Uma representação majestosa da Ascensão de Jesus Cristo, ambientada em uma colina fora de Jerusalém. A figura central, Jesus, é mostrada em uma túnica branca fluida, ascendendo graciosamente em direção a uma luz brilhante e etérea acima. Ele está cercado por um grupo de discípulos maravilhados, cada um retratado com expressões distintas de admiração e reverência. Estes discípulos, em trajes simples e apropriados para a época, olham para cima, encarnando uma mistura de espanto e devoção. O cenário ao fundo apresenta um céu brilhante e expansivo salpicado de nuvens suaves e a silhueta distante da arquitetura icônica de Jerusalém, realçando a atmosfera espiritual e divina da cena. Esta imagem transmite poderosamente o momento sereno e milagroso da Ascensão, enfatizando sua significância na teologia cristã.

1. FUNDAMENTOS BÍBLICOS

A Ascensão do Senhor é um evento fundamental no cristianismo, amplamente documentado nos textos sagrados, que oferece uma visão rica e complexa sobre a conclusão da missão terrena de Jesus e o início de sua existência glorificada ao lado do Pai. Este segmento explora as narrativas evangélicas principais que descrevem este acontecimento transcendental, cada uma contribuindo com perspectivas únicas que enriquecem nosso entendimento teológico.

Evangelho de Marcos (Marcos 16:19)

No Evangelho de Marcos, a Ascensão é mencionada brevemente no final do livro. "Depois de lhes falar, o Senhor Jesus foi elevado aos céus e assentou-se à direita de Deus." Este versículo não apenas confirma a realidade física da Ascensão, mas também destaca a exaltação de Jesus, enfatizando sua divindade e a inauguração de seu reinado eterno. A menção de Jesus sentando à direita de Deus traz imagens de poder e autoridade, reforçando o papel de Cristo como rei e juiz conforme a tradição judaico-cristã.

Evangelho de Lucas (Lucas 24:50-53)

Lucas oferece um relato mais detalhado e narrativo da Ascensão. Ele descreve como Jesus levou os discípulos para fora até Betânia, abençoou-os, e enquanto os abençoava, foi elevado ao céu. Este momento é carregado de significado simbólico; a bênção final de Jesus reafirma seu cuidado contínuo pelos discípulos e por sua missão. Além disso, Lucas destaca a reação dos discípulos, que retornaram a Jerusalém com grande alegria e continuaram a louvar a Deus. Isso reflete a transformação de sua compreensão e a aceitação da nova missão como testemunhas da ressurreição e da ascensão de Jesus.

Atos dos Apóstolos (Atos 1:9-11)

Nos Atos dos Apóstolos, também escrito por Lucas, a Ascensão é descrita com detalhes adicionais que complementam seu evangelho. "Depois de dizer isso, foi elevado às alturas enquanto eles olhavam, e uma nuvem o escondeu de seus olhos." Aqui, a nuvem não só serve como um veículo de divindade, evocando a presença de Deus no Antigo Testamento, mas também marca a transição de Jesus para uma realidade que transcende a compreensão humana. A presença de dois homens vestidos de branco, provavelmente anjos, que prometem o retorno de Jesus, reforça a futura esperança messiânica e escatológica da Igreja.

Cada uma dessas narrativas não apenas documenta o evento histórico da Ascensão, mas também tece uma rica tapeçaria de implicações teológicas. Elas confirmam a identidade divina de Jesus, sua realeza eterna, e o começo de uma nova fase na vida da Igreja, que é chamada a esperar ativamente seu retorno triunfal. Esses textos formam a base para uma compreensão mais profunda da função e do poder de Cristo no céu e de sua intercessão contínua em favor de seu povo na terra.

 

2. SIGNIFICADO TEOLÓGICO

A Ascensão do Senhor não é apenas um evento histórico que assinala o término da missão terrena de Jesus; ela é também um profundo ato teológico que reafirma duas doutrinas centrais da fé cristã: a realeza e o sacerdócio de Cristo. Este momento é fundamental para entendermos o papel contínuo de Cristo no céu como nosso mediador e intercessor perante Deus.

Realeza e Sacerdócio de Cristo

A Ascensão coroa Jesus como o Rei eterno e o Sumo Sacerdote, cuja autoridade é incomparável e cuja função é perpetuamente eficaz. A expressão bíblica de Cristo sentando-se "à direita de Deus" é carregada de significado real, representando um lugar de honra e poder supremo no cosmos. No contexto judaico, o rei não era apenas um governante político, mas também uma figura sacerdotal que intercedia pelo povo. Jesus, ao ascender aos céus, assume esse papel duplo de forma definitiva e eterna.

O Novo Testamento, especialmente nas cartas de Paulo e na Carta aos Hebreus, detalha como Jesus, por meio de sua morte e ressurreição, cumpriu perfeitamente os requisitos do sacerdócio levítico e, ao ascender, transcendeu-os. Ele se torna o mediador da Nova Aliança, intercedendo pelos fiéis como um sacerdote permanente. Essa natureza sacerdotal é essencial para a compreensão da eficácia contínua da obra expiatória de Cristo e da aplicação dos seus méritos em favor de sua Igreja.

Papel Intercessor

A Ascensão marca a transição de Jesus para um papel intercessor ativo, um aspecto vital da teologia cristã que impacta diretamente a vida de oração e a esperança dos fiéis. Como afirma a Carta aos Hebreus, Jesus "está sempre vivo para interceder" por aqueles que se aproximam de Deus por meio dele. Essa intercessão é contínua e baseada na perfeita compreensão e compaixão de Cristo pelas fraquezas humanas, pois ele mesmo experimentou tais fraquezas, exceto pelo pecado.

A função intercessora de Cristo é multifacetada: ele não apenas apresenta nossas orações a Deus, mas também nos assegura o acesso ao Pai. Cristo, como nosso intercessor, também é um advogado que pleiteia nossa causa diante de Deus, assegurando a misericórdia e a graça para o auxílio em tempos de necessidade. Este papel é um conforto para os cristãos, proporcionando uma fonte de segurança espiritual e encorajamento, sabendo que seu Salvador não apenas entende suas lutas, mas está ativamente envolvido em ajudá-los a superá-las.

Em suma, a Ascensão de Cristo não é um afastamento de seu povo, mas uma assunção de seu poderoso ministério no céu, onde ele continua a reinar como rei e a servir como nosso Sumo Sacerdote e intercessor. Esta verdade central reafirma a promessa da presença contínua de Cristo conosco, seu poder de salvar completamente aqueles que por ele se achegam a Deus.

 

3. IMPLICAÇÕES ECLESIOLÓGICAS

A Ascensão do Senhor Jesus não somente cimenta doutrinas teológicas centrais, mas também configura a estrutura e função da Igreja no mundo. Este evento chave prepara o palco para o envio do Espírito Santo em Pentecostes e redefine a identidade e missão da Igreja como o Corpo de Cristo na Terra.

Envio do Espírito Santo

A Ascensão de Jesus é diretamente responsável pelo derramamento do Espírito Santo, que ocorre em Pentecostes. Antes de ascender, Jesus promete aos seus discípulos que "não os deixaria órfãos" e que enviaria o "Consolador" (João 14:18, 26). Esta promessa é crucial porque o Espírito Santo não somente consola, mas também capacita os discípulos para a missão global que têm pela frente. A vinda do Espírito Santo, que só é possível através da Ascensão de Jesus, equipa a Igreja com dons diversos, fortalecendo-a para propagar o evangelho com poder e autoridade.

A Ascensão, portanto, não deve ser vista como uma ausência de Cristo, mas como um evento que facilita uma nova presença de Deus entre o povo através do Espírito Santo. Esta nova dinâmica do "Deus conosco" através do Espírito transforma radicalmente a capacidade da Igreja de cumprir sua missão, permitindo que os seguidores de Cristo realizem obras maiores em nome d'Ele (João 14:12).

Igreja como Corpo de Cristo

Com a Ascensão de Jesus e o envio do Espírito Santo, a Igreja é inaugurada como o Corpo de Cristo na Terra. Esta metáfora, amplamente utilizada nas cartas de Paulo, enfatiza que, embora Jesus não esteja fisicamente presente entre nós, Ele continua a operar no mundo através de sua Igreja. Cada membro da Igreja é então chamado a ser um representante de Cristo, trabalhando em unidade para manifestar seu amor e poder em todos os lugares.

A ideia do Corpo de Cristo é vital para entender como a Ascensão influencia a eclesiologia. Não é apenas uma organização de crentes, mas um organismo vivo, dinâmico e interconectado, cuja cabeça é Cristo. Dessa forma, a missão da Igreja é uma extensão da missão de Jesus; ela é chamada a pregar o Evangelho, curar os enfermos, cuidar dos necessitados, e lutar por justiça e paz, refletindo o reino de Deus já inaugurado, mas ainda não plenamente realizado.

Em resumo, a Ascensão de Jesus molda profundamente a função da Igreja no mundo. Ao ascender ao céu e enviar o Espírito Santo, Jesus não somente equipa a Igreja com poder divino mas também redefine sua identidade como o seu Corpo ativo na Terra. Assim, a Igreja não é apenas uma instituição que lembra eventos passados, mas uma comunidade viva e respiratória, impulsionada pelo Espírito a continuar a obra redentora de Cristo até que Ele venha novamente.

 

CONCLUSÃO

A Ascensão do Senhor oferece profundas implicações para a vida espiritual e prática dos fiéis, reorientando tanto a oração quanto a missão cristã no contexto de uma esperança renovada e de um chamado à ação persistente.

Vida de Oração e Missão

A ascensão de Cristo ao céu não é apenas um testemunho de sua divindade e autoridade, mas também um evento que enriquece profundamente a vida de oração e a missão dos cristãos. Com Cristo no céu, intercedendo continuamente ao Pai em nosso favor, os fiéis são encorajados a se aproximarem com confiança do trono da graça. Esta intercessão celestial garante que nossas preces não são em vão, mas são ouvidas e potencializadas pela advocacia de Cristo.

Além disso, a esperança na ascensão de Cristo serve como um impulso vital para a missão cristã. Sabendo que Jesus foi elevado ao céu e que voltará da mesma forma que ascendeu, os cristãos são inspirados a viver com urgência e propósito. Há um mandato divino para proclamar o Evangelho a todas as nações, refletindo o poder e a autoridade do Cristo ascensionado através de nossas palavras e ações. A Igreja, fortalecida pelo Espírito Santo enviado após a Ascensão, é capacitada a levar a cabo esta missão com ousadia e amor.

Chamado à Santidade

A Ascensão de Cristo reitera o chamado à santidade que permeia toda a Escritura. Jesus, ao ascender ao céu, não nos deixou sem direção, mas reforçou a promessa de estar conosco até o fim dos tempos, como uma fonte de esperança e um catalisador para a transformação moral e espiritual. Este chamado à santidade é um convite para viver de maneira que reflita o caráter de Cristo, buscando a justiça, praticando o amor e cultivando a paz em cada aspecto de nossas vidas.

Este chamado também é profundamente missionário. Viver uma vida santa é testemunhar o poder transformador do Evangelho. A santidade não é uma retirada do mundo, mas uma presença ativa e engajada dentro dele, procurando transformar as realidades terrenas com os valores do Reino de Deus. Cada ato de amor, cada gesto de compaixão e cada palavra de verdade são partes integrantes dessa missão sagrada, impulsionadas pela certeza da presença contínua de Cristo através do Espírito Santo.

Portanto, a Ascensão de Cristo desafia os cristãos a abraçarem uma vida de oração fervorosa e uma missão vibrante, ancorados na esperança de sua volta triunfal e na certeza de sua intercessão contínua. Assim, somos chamados a viver não como pessoas de um tempo passado, mas como cidadãos de um reino eterno, ativamente engajados na transformação do mundo até que Ele venha novamente.

ORAÇÃO DE ENCERRAMENTO

Ó Senhor Jesus Cristo, que pela Tua gloriosa Ascensão, abriste as portas do céu e nos preparaste um lugar junto ao Pai, nós Te agradecemos por este inefável dom. Subiste aos céus, não para nos deixar órfãos, mas para nos enviar o Consolador e continuar intercedendo por nós como nosso eterno mediador e advogado.

Fortalece-nos, ó divino Senhor, com o Espírito Santo que prometeste aos teus Apóstolos, para que, animados por Tua graça, possamos aspirar às realidades celestiais e nos desapegar das terrenas. Que, seguindo o exemplo de Tua humildade e obediência, possamos também nós, um dia, partilhar da Tua glória.

Que a Tua Ascensão continue a ser luz para os nossos caminhos e a firme esperança de nossa própria ascensão ao céu, onde, com os santos e anjos, possamos louvar e glorificar-Te por toda a eternidade. Amém.


 

A ASCENSÃO DO SENHOR NOS CATECISMOS DE SÃO PIO V E SÃO PIO X

Catecismo Maior de São Pio X

O Catecismo Maior de São Pio X detalha a celebração da Ascensão do Senhor como o dia em que Jesus Cristo subiu ao céu por sua própria virtude, 40 dias após sua Ressurreição, diante de seus discípulos. A Ascensão é apresentada como um evento de significativa importância por várias razões:

1. Jesus toma posse do reino eterno conquistado com sua morte.

2. Prepara um lugar para nós e atua como mediador e advogado junto ao Pai.

3. Envia o Espírito Santo aos seus Apóstolos.

Além disso, ressalta que Jesus não subiu ao céu sozinho, mas foi acompanhado pelas almas dos antigos Padres resgatados do limbo. No céu, Cristo está à direita de Deus, significando igualdade com o Pai em glória divina e, como homem, elevação acima de todos os anjos e santos (Capítulo X, Parágrafos 85-89).

Catecismo Romano de São Pio V

O Catecismo Romano de São Pio V profundamente explica o sexto artigo do Credo, relacionado à Ascensão. Enfatiza que Cristo subiu aos céus como homem, mas, sendo Deus, nunca se ausentou de lá, pois sua divindade permeia todos os lugares. Ele subiu aos céus por própria virtude, não sendo levado por forças externas, mas movendo-se por uma poder divino intrínseco.

O catecismo também discute o significado de Cristo estar "sentado à direita de Deus", interpretado como uma posição de honra suprema e não uma referência literal a um corpo físico. Essa posição à direita indica a supremacia e a autoridade regal de Cristo, superior a todas as criaturas, refletindo a glória que Ele, como homem, alcançou no céu (Capítulo Sétimo, Seção I-II).

Conclusão

Ambos os catecismos destacam a Ascensão do Senhor não apenas como um evento bíblico, mas como um ponto culminante teológico que conecta a missão terrena de Cristo com sua função contínua como intercessor celestial. Ele prepara um lugar para nós no céu, atua como nosso mediador, e com sua Ascensão, abre as portas para o envio do Espírito Santo, consolidando sua igreja na terra e fortalecendo a fé e a esperança dos fiéis. A Ascensão, portanto, é central na vida e prática da fé católica, oferecendo uma visão de como os aspectos terrenos e celestiais da existência de Cristo estão intrinsecamente ligados à esperança da salvação eterna.

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